Quem foi Dietrich Bonhoeffer
Há uma tristeza silenciosa ao lembrar de Dietrich Bonhoeffer, um homem cuja coragem parece um eco distante em tempos de divisão. Nascido em 1906, em Breslau, na Alemanha, Bonhoeffer foi um teólogo luterano, pastor e pensador movido por uma fé profunda e um compromisso com a justiça. Estudou teologia em Tübingen, Berlim e Nova York, onde uniu espiritualidade e responsabilidade social. Como líder da Igreja Confessante, resistiu à submissão do cristianismo ao regime nazista, denunciando sua ideologia opressiva. Bonhoeffer foi além das palavras: integrou a resistência alemã, participando de conspirações como a Operação Valquíria para derrubar Hitler. Preso pela Gestapo em 1943, passou seus últimos anos em uma cela, escrevendo Cartas e Papéis da Prisão. Ali, refletiu sobre a “estupidez” — não a falta de inteligência, mas a entrega cega a narrativas coletivas que sufocam a razão e a moral. Executado em Flossenbürg em 1945, aos 39 anos, semanas antes do fim da Segunda Guerra, Bonhoeffer deixou um legado de melancolia e esperança, um convite a refletir sobre o que nos faz humanos diante da injustiça.
A “Estupidez” e o Brasil de Hoje
As palavras de Bonhoeffer, escritas na solidão de uma prisão, carregam uma melancolia que ecoa no Brasil de 2025. Ele via a “estupidez” (Dummheit) como um mal mais sutil que a crueldade, não por ignorância, mas por uma escolha de abandonar o pensamento crítico, rendendo-se a narrativas que prometem pertencimento, mas entregam divisão. “A estupidez é um inimigo mais perigoso do bem do que a maldade”, escreveu, observando como, na Alemanha nazista, a propaganda transformava pessoas comuns em peças de um sistema desumano. Para Bonhoeffer, a estupidez surge quando indivíduos cedem à pressão de grupo, rejeitam a lógica e, por conformismo, tornam-se cúmplices de injustiças. Apenas um “choque” — uma ruptura pessoal ou social — poderia despertar a consciência.
Essa “estupidez” reflete uma verdade dolorosa: a liberdade exige responsabilidade, mas muitos preferem terceirizá-la. Em vez de enfrentar o peso de pensar por si mesmos, indivíduos entregam sua autonomia a ideologias ou líderes que oferecem respostas prontas. Um estudo psicológico clássico, conduzido por Stanley Milgram nos anos 1960, ilustra essa tendência. Na experiência, participantes aplicavam choques elétricos em outros, mesmo contra sua consciência, desde que instruídos por uma figura de autoridade. Milgram mostrou que 65% dos participantes obedeciam até o limite, revelando como a submissão a um líder pode suprimir a responsabilidade moral. Bonhoeffer, que viu sua nação se curvar a uma ideologia totalitária, entenderia essa entrega como a raiz da “estupidez”.
No Brasil, essa terceirização da responsabilidade é uma ferida aberta. Vivemos em um país partido, onde grupos se agarram a narrativas opostas, transformando o diálogo em um eco de vozes distantes. Nas redes sociais, como o X, mensagens inflamadas circulam como um rio desenfreado, compartilhadas por pessoas que, talvez, busquem apenas um senso de direção. Em 2023, os protestos em Brasília, que culminaram na invasão dos Três Poderes, revelaram o peso dessa cegueira coletiva: multidões, movidas por narrativas que as uniam sob a sombra de líderes ou ideias, agiram de forma transloucada e inconsequente, esperando uma reação que não veio, usados de massa de manobra e descartados assim que não foram mais úteis. Não é apenas o conflito que entristece, mas a escolha de abrir mão da liberdade de pensar, delegando-a a quem promete certeza em um mundo complexo.
Essa divisão atravessa famílias, amizades e praças públicas, como se estivéssemos nos ferindo com nossas próprias mãos. Questões urgentes, como a desigualdade que separa milhões ou a violência que rouba vidas, ficam em segundo plano, sufocadas por uma guerra de palavras que não resolve, apenas fere. Bonhoeffer nos faz perguntar: por que escolhemos essa dor? Por que trocamos a liberdade de refletir pela segurança de seguir um líder ou uma ideologia? Sua melancolia aponta para a dificuldade de despertar, mas também para a esperança. Ele acreditava que a consciência podia ser reacendida. No Brasil, isso poderia começar com gestos simples: pausar antes de adotar uma narrativa, buscar a verdade em fontes confiáveis, ouvir quem pensa diferente. A educação, que forma mentes críticas, é um caminho lento, mas vital. Escolas, famílias e comunidades podem ensinar que a liberdade exige coragem, que o outro não é um estranho, mas um reflexo de nós mesmos.
Um Chamado à Reflexão
A vida de Bonhoeffer terminou em silêncio, mas suas palavras ressoam como um lamento suave e persistente. Ele nos lembra que a “estupidez” não é nosso destino, mas uma escolha que podemos desfazer. No Brasil de 2025, onde a divisão nos separa e a entrega cega nos fere, há uma tristeza em ver como renunciamos à liberdade de pensar. Mas há também um fio de esperança. Podemos escolher ouvir, questionar, assumir a responsabilidade que a liberdade exige. Como Bonhoeffer, que enfrentou a escuridão com coragem, podemos romper o ciclo da estupidez. Sua pergunta, quase um sussurro, permanece: teremos a força de pensar por nós mesmos, ou continuaremos a nos perder na multidão? A resposta, com sua dor e sua promessa, está em nossas mãos.