Após ser exonerada do Ministério da Saúde pelo presidente Lula em 25 de fevereiro de 2025, Nísia Trindade receberá R$ 265 mil em quarentena remunerada, conforme decisão da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, tomada em 28 de abril. Por seis meses, a ex-ministra terá direito a R$ 44.008,52 mensais, sem desempenhar qualquer função no governo. Enquanto brasileiros batalham para pagar contas de luz e comprar comida, o gasto com ex-autoridades levanta duras críticas sobre a gestão do dinheiro público em tempos de crise.
A Lei nº 12.813/2013 prevê a quarentena remunerada para evitar que ex-ocupantes de cargos estratégicos usem informações privilegiadas ao migrar para o setor privado logo após deixarem o governo. Apesar da intenção de proteger a ética pública, o pagamento de salários tão altos, como os R$ 44 mil mensais de Nísia, é questionável em um cenário de inflação elevada e aperto fiscal, onde cada centavo do orçamento deveria ser cuidadosamente direcionado.
Em nota ao portal Metrópoles, Nísia informou que voltará a atuar como pesquisadora na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), onde é servidora concursada. “Não há contradição entre estar em quarentena, conforme previsto na legislação, e retomar minhas atividades como pesquisadora da Fiocruz, o que, a rigor, nunca deixei de exercer”, afirmou. A explicação, porém, não ameniza a indignação. Se Nísia pode voltar à Fiocruz, uma instituição pública vinculada ao próprio Ministério da Saúde, por que o governo precisa pagar um salário ministerial tão elevado durante seis meses? Não seria mais justo que ela recebesse apenas o salário de pesquisadora, já que está de volta ao seu cargo concursado?
O caso de Nísia não é isolado. A ex-secretária de Estratégia e Redes da Secretaria de Comunicação (Secom), Brunna Rosa Alfaia, aliada da primeira-dama Janja da Silva, também foi agraciada com uma quarentena remunerada após ser exonerada em 17 de janeiro. Brunna, que recebia R$ 18.469,94 por mês, continuará sendo paga sem trabalhar, em mais um exemplo de como o dinheiro público é usado para beneficiar ex-funcionários de alto escalão. A Comissão de Ética Pública justifica essas decisões como forma de evitar a chamada “porta giratória”, mas a prática levanta questionamentos. Por que não há um teto para esses pagamentos ou uma revisão da lei para torná-la mais razoável?
Enquanto isso, o brasileiro comum enfrenta um cenário bem diferente. Com a inflação corroendo o poder de compra e o desemprego ainda rondando muitas famílias, o contraste entre os privilégios de ex-autoridades e a luta diária da população é gritante. Um trabalhador que ganha um salário mínimo de R$ 1.412 precisa trabalhar mais de 31 meses para receber o que Nísia ganhará em seis meses sem esforço. Como explicar isso a quem acorda cedo, enfrenta transporte lotado e mal consegue fechar as contas no fim do mês?
A legislação pode até prever a quarentena remunerada, mas a sua aplicação em casos como esse soa como um tapa na cara do contribuinte. Em vez de direcionar recursos para áreas críticas, como saúde, educação ou infraestrutura, o governo opta por manter privilégios que desafiam o bom senso. Nísia Trindade, com sua trajetória na Fiocruz e no Ministério, certamente tem méritos acadêmicos, mas isso não justifica o uso de dinheiro público para bancar um salário exorbitante sem trabalho correspondente. É hora de o Congresso rever essa lei e acabar com essas “boquinhas” que pesam no bolso de todos nós.
Os brasileiros merecem transparência e responsabilidade na gestão dos recursos públicos. Enquanto o governo não cortar esses excessos, continuaremos a ver casos como o de Nísia, onde a demissão vem acompanhada de um prêmio quase que milionário, e a conta, como sempre, sobra para o povo.