Assessores da Casa Branca estão se preparando para impor novas tarifas sobre a maioria das importações em 2 de abril, antecipando uma escalada nas hostilidades econômicas globais, para a data que o presidente Donald Trump chamou de “Dia da Libertação”.
Em seus dois primeiros meses no cargo, o presidente aumentou as tarifas sobre cerca de US$ 800 bilhões em importações da China, México e Canadá, embora as estimativas variem muito. Essas tarifas fizeram com que o mercado de ações derretesse e aumentaram os riscos de uma recessão nos EUA, ao mesmo tempo que provocaram retaliações contra as indústrias nacionais por parte dos países afetados.
Apesar da reação negativa, a equipe de Trump está agora prometendo criar um novo regime tarifário, dessa vez mais abrangente. As novas taxas atingiriam quase todos os países que realizam comércio com os EUA, e estão estimadas em trilhões de dólares.
O presidente alega que as tarifas são necessárias para incentivar as empresas a transferir a produção de volta para os EUA e forçar concessões de parceiros comerciais estrangeiros, mas as consequências abalaram investidores e consumidores, levando a um ambiente de elevada incerteza e queda em importantes índices econômicos.
“É um dia de libertação para o nosso país, porque vamos recuperar grande parte da riqueza que tão tolamente cedemos a outros países, incluindo amigos e inimigos”, disse Trump a repórteres na segunda-feira
Trump apelidou o próximo estágio de sua guerra comercial de “tarifas recíprocas”. A Ideia foi aventada pela primeira vez durante sua campanha presidencial de 2024, sob o argumento de que outros países impõem barreiras comerciais muito mais altas do que os EUA. Trump disse que os americanos deveriam igualar essas tarifas com taxas “recíprocas” que, segundo ele, forçariam outros países a reduzir suas taxas sobre produtos fabricados nos EUA.
“Se a Índia, a China ou qualquer outro país nos impuser uma tarifa de 100% ou 200% sobre os produtos fabricados nos EUA, nós os impomos exatamente a mesma tarifa”, disse Trump em um vídeo divulgado durante a campanha presidencial. “Em outras palavras, 100% é 100%. Se eles cobrarem dos EUA, nós cobraremos deles – olho por olho, tarifa por tarifa, exatamente o mesmo valor.”
Embora muitos países protejam mercados específicos com altas barreiras comerciais, a maioria das economias avançadas mantém perfis tarifários semelhantes. Em uma base ponderada de comércio, a tarifa média dos EUA é de 2,2%. A do Japão é de 1,9% e a da União Europeia é de 2,7%, um pouco mais alta do que a média dos EUA, de acordo com a Organização Mundial do Comércio.
Um país, uma tarifa
A tarefa de definir com precisão a imposição de novos impostos de importação pode exigir meses de trabalho preparatório. Entre as figuras do governo próximas do presidente Trump, não há convergência. Há aqueles que defendem uma abordagem mais amena, para garantir que as tarifas sejam efetivas, como é o caso do secretário de Estado Marco Rubio. Já Navarro, conselheiro sênior da Casa Branca para comércio e manufatura, está entre os que pressionam por uma ação rápida e agressiva.
Autoridades do governo consideravam elencar todos os parceiros comerciais dos EUA em três grupos — alto, médio ou baixo — e atribuir uma tarifa de acordo. A ideia foi rejeitada, no entanto, em favor de uma da calibração de uma nova tarifa para cada parceiro comercial, segundo fontes anônimas do governo. A proposta de classificar os países em três grupos, e sua rejeição, foi relatada pela primeira vez pelo Wall Street Journal.
Bessent, o secretário do Tesouro, disse no programa Mornings with Maria, da Fox Business, na terça-feira, que o governo considerará uma ampla gama de fatores ao determinar as tarifas sobre países estrangeiros, incluindo manipulação de moeda, “supressão de mão de obra” e outras “barreiras não tarifárias”.
Os EUA farão um ranking dos parceiros comerciais, atribuindo um número para cada país, em um esquema que ajudará a determinar sua taxa tarifária, disse Bessent. Também expressou certo otimismo ao afirmar que muitas tarifas não entrarão em vigor, pois os países concordarão em alterar suas próprias tarifas de importação antes do anúncio de 2 de abril.
Volatilidade à vista
Por mais estruturado que seja, o novo regime tarifário provavelmente abalará ainda mais os mercados globais. Em Wall Street, o índice S&P 500 perdeu mais de 8% no último mês; o Nasdaq, índice de tecnologia, caiu quase 13% no mesmo período.
A confiança do consumidor caiu na sexta-feira para sua marca mais baixa desde novembro de 2022, e a perspectiva de inflação de cinco anos dos americanos subiu para uma taxa anual de 3,9%, a mais alta desde 1993
Na terça-feira, o governo reportou forte aumento da produção industrial em fevereiro, atingindo máxima de dois anos. Analistas, porém, atribuem o salto a uma reação temporária aos anúncios de tarifas presidenciais.
“Os fabricantes correram para produzir bens em fevereiro antes que grandes tarifas sobre as importações pudessem ser impostas, bem como para atender a um aumento temporário induzido por tarifas nos pedidos de famílias e empresas”, escreveu Samuel Tombs, economista-chefe da Pantheon Macroeconomics para os EUA.
O avanço deve ser breve. Em fevereiro, novos pedidos caíram quando fabricantes elevaram preços para compensar o maior custo de metais e componentes chineses, segundo Tombs, com base na pesquisa do Institute of Supply Management.
Me proteja, presidente!
Enquanto isso, vários setores — incluindo pescadores comerciais, produtores de árvores de Natal e fabricantes de doces e geleias — se alinharam nas últimas semanas para pedir proteção tarifária contra concorrentes estrangeiros.
John Wyckoff, presidente da National Christmas Tree Association, solicitou tarifas maiores para árvores artificiais, afirmando que 95% dessas importações vêm da China, “onde os custos de produção mais baixos decorrentes de mão de obra e materiais baratos permitem que os produtores estrangeiros subcotem os produtores nacionais”.
Segundo a Southern Shrimp Alliance, que busca proteção tarifária, importações de camarão congelado reduziram preços domésticos para aproximadamente US$ 1,25 por libra, contra cerca de US$ 3 nos anos 1980. Essa concorrência afeta caminhoneiros, fornecedores e processadores que atendem à frota pesqueira.
Michael Madriaga, vice-presidente da J.M. Smucker Co., afirmou que tarifas da União Europeia de até 24% prejudicam vendas americanas de geléias no continente. Em 2024, os EUA exportaram apenas US$ 295.614 desses produtos para a Europa, enquanto importaram quase US$ 238 milhões em produtos similares europeus.
Como diz o ditado: “onde passa boi, passa boiada”. Nesse sentido, setores minoritários na economia americana, normalmente com baixa intensividade em capital, aproveitam a guerra tarifária gerada por Trump para tentar aumentar as suas margens de lucro internamente, ou viabilizar a exportação de produtos pouco competitivos para o exterior.